Mesmas palavras já desgastadas pelo uso. Mesmo gesto mecânicos. Mesmo objetivos já ultrapassados. Amores blasé. A mesmice de sempre, pessoas repetitivas. Começo a criar um desgosto pelas relações humanas, e pelos relacionamentos. Fumo três cigarros por dia na esperanças de suprir esse vazio aqui no peito. Fumaça preenche, fumaça ocupa, fumaça mata. Eu sei, mas morrer para mim parece como uma luz no fim do túnel. Cada baforada de cigarro que dou na janela volta contra minha face. Vista embaçada, vidro embaçado. Chuva. Chuva. Merda de chuva. Ficar preso dentro dessa casa me corrói como ácido, nunca fui do tipo bicho-domesticado. Sou bicho-livre, cada dia um lugar. Cada lugar um grupo. Cada grupo um amor. Mutável. Promíscuo? Não, promiscuidade tem relação com sexo e eu falo aqui de sentimentos. Relação sentimental não sexual. Abri a porta e aquele vento frio bate no meu rosto.
– Chuva desgraçada – Pensei –, mas preciso comprar pão e algo para comer.
Cigarro e chuva, não é uma boa combinação. Não que seja perigosa, só não é gostosa. No meio da chuva não. Piso cada força como se estivesse matando um bicho-de-sete-cabeças. Libero minha raiva, mas continuo com essa agonia dentro do peito. A chuva tem esse poder sobre mim, me deixa preso em casa e conseqüentemente meus monstros saem da gaiola. Viro o playcenter na hora do terror. Preparem-se que a bruxa está solta. Cadáveres que pensei que estivessem em estado de decomposição surgem: zumbis. Vampiros sanguessugas vestidos de príncipes europeus. Fico sem reação esperando que alguém venha me salvar desses monstros ou que me acorde desse pesadelo. Merda! Esses carros passam rápidos e sempre me molham. Parece praga. Sábado chuvoso, no meio da tarde. Convites para festas, boates e encontros regados a bebidas e gente bonita. E eu indo comprar pão. Mas de que adianta sair para festa e voltar para casa sempre com o coração vazio. Se um dia voltar para casa com o coração aquecido e com um amor desses que valham à pena, ai sim recomendarei festas. Mas não, sempre a mesma coisa: Você se arruma como se nunca tivesse sido bonito, passa o perfume mais sedutor, vai para o tal lugar cheio-de-gente-afim-de-algo, sexo provavelmente, bebe, faz chame, encontra alguém, vai para casa ou motel ou qualquer lugar, mas sempre acaba na sua cama. Sozinho. Não minto, nem sou vidente. Prefiro o conforto da minha casa a sair pelas ruas atrás de uma ilusão, no fim termino no mesmo lugar.
- 4,70 senhor. – A mulher do caixa avisa com sua voz irritante. Cabelo horrível, sempre tenho vontade de falar. Nunca falo.
Essa padaria sempre foi assim. Gente chata, gente feia. Essa chuva irritante não passa, pelo menos em frente à padaria dá pra ficar esperando um pouco. Vou pegar uma puta de uma gripe. Foda-se. Cada vez mais sem saco para pessoas, acho que peguei o vírus da imunodeficiência de relações interpessoais. Um grande amor, para mim isso é piada. Brincadeira de mau gosto. Comigo sempre foi assim. Pegadinha, eu não te amo e agora estou te deixando. Grande amor, grande coisa isso.
- Com licença, acho que conheço você. Por acaso não estava naquele bar semana passada?
- Hã? Não sei, qual bar?
- Aquele que fica de frente a uma praça. Não me lembro o nome agora. Você estava tomando umas misturas estranhas. Estava com uma calça preta justa, uma camisa xadrez. Era você sim, não esqueceria.
- Ah, sei sim! Foi em um sábado não? Aquela noite que estava fria. Eu me lembro.
-Prazer, Tiago.
-Prazer, Ian.
Como você se lembra de mim tão bem?
-Algumas pessoas marcam. Mesmo se não falamos com elas. Possuem alguma certa marcar registrada. Seu sorriso, por exemplo, nunca irei tirá-lo da minha mente.
- Obrigado.Você é uma pessoa que dificilmente esquecerei.
- E por que deixaria que me esquecesse? Moras onde?
- Aqui perto. Umas duas ruas.
- Posso te acompanhar?
- Com prazer.
A chuva passou. Agora só umas nuvens querendo impedir o sol de aparecer. Mas, o sol sempre aparece. Agora minhas angústias vão embora. Volto a ser bicho-livre. E o amor? Bem, cada lugar um novo amor. Por que não?
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